Não entendi, em absoluto, a razão da expulsão. Como a deliberação é secreta, dificilmente o réu fica sabendo que detalhe do processo pesou na decisão da comissão. A única base que me foi fornecida, ao final, foi a leitura de Efésios 4: 19, que é como segue:
"Tendo perdido todo o senso moral, entregaram-se à conduta insolente para praticar com ganância todo tipo de impureza."
O texto é explicado com muitos detalhes no artigo de 2006, que pôs a pornografia na lista de pecados que são passíveis de excomunhão. Mas foi necessário recorrer a muitos termos gregos, os quais são acompanhados por definições de peritos no idioma, e não estou à altura para poder discorrer sobre a validade ou não de tais argumentos. Quando escrevi minha confissão, fui claro ao dizer que não iria recorrer de uma possível desassociação. No entanto, ao dizer isso, eu presumia que entenderia as razões da expulsão, o que evidentemente não foi o caso. Para a conscientização do leitor, consideremos alguns fatos.
Os juízes juntos deviam ter mais de 50 anos de atividade, dispuseram de vários cursos para se qualificarem como juízes, possuem livros especiais sobre suas atividades (livros que lhes são de leitura exclusiva), cartas regulares destinadas somente a eles sobre assuntos que envolvem julgamento, dispuseram ainda de quatro horas de deliberações secretas, e ainda mais, supostamente, a orientação de Deus via espírito santo – tudo isso para chegar à conclusão de que eu devia ser desassociado; para que eu pudesse chegar à mesma conclusão, dispunha apenas da Bíblia e de um artigo repleto de termos gregos.
Algo que muito me intrigava é que a confissão voluntária de 2007 havia sido completamente ignorada, provavelmente sob o argumento de que já se havia passado muito tempo. Diante disso, estou propenso a considerar que foi mais importante o meu histórico do que propriamente a “descoberta” recente. No entanto, esse mesmo histórico fazia parte de minha confissão em 2007. Como isso pode ter sido levado em conta agora, mas não em 2007, é algo que não consigo compatibilizar com uma junta de homens que julga sob a orientação do espírito santo.
Que se requer que decisão dos anciãos seja encarada como se fosse a decisão de Deus, já ficou dito antes, quando considerei Mateus 18: 18. Em adição a isso, na obra Estudo Perspicaz das Escrituras, sob o verbete “mão”, o Corpo Governante apresenta uma justificativa com base em Apocalipse 1: 16 e 2:1. Leiamos:
“Diz-se a respeito de Jesus, na visão de Revelação (Apocalipse), que ele tem na sua mão direita as sete estrelas das sete congregações. Quer dizer, todos estes corpos de anciãos têm o seu favor e estão sob o seu pleno controle, poder e direção. — Re 1:16, 20; 2:1.” (Estudo Perspicaz das Escrituras, volume 2, página 763). Em complemento disso, em 2007, o Corpo Governante escreveu o seguinte:
"É possível que pensemos que algo antibíblico esteja acontecendo na congregação e que, embora os anciãos locais saibam do assunto, pelo visto não o corrigem. Naturalmente, pode ser que o assunto já tenha sido ou esteja sendo cuidado de acordo com as Escrituras e com base em fatos que desconhecemos. Mas mesmo que a situação seja assim como pensamos, considere o seguinte: Por um tempo, houve um caso de pecado grave na congregação em Corinto, uma congregação que tinha o apoio de Jeová.
No devido tempo, Deus fez com que o caso fosse resolvido de modo correto e firme. (1 Coríntios 5:1, 5, 9-11)" (
A Sentinela de 15 de abril de 2007, página 28).
Com esses dois argumentos, cada Testemunha é incentivada a raciocinar que tudo o que ocorre na congregação está absolutamente sob o controle de Cristo – embora possa não parecer. As coisas que aparentemente estão descontroladas serão – no devido tempo de Deus – resolvidas.
Essa linha de raciocínio me fez chegar à conclusão de que os quatro anos passados da confissão eram, dessa maneira, inúteis na argumentação contra a estrutura espiritual montada em defesa dos anciãos.
Outro fator que tomou muito dos meus pensamentos foi um detalhe que me trouxe à atenção a comissão que me julgou em 2007. Um dos anciãos considerou que eu havia permanecido no erro por um tempo considerável e leu para mim uns versículos do livro bíblico de Josué. O capítulo sete desse livro trata do pecado de Acã. Esse era um soldado israelita que havia furtado, no campo de batalha, objetos de valor, a respeito dos quais Deus havia dado ordem clara de que deviam ser queimados. Em resultado desse roubo, na batalha seguinte Deus retirou sua proteção e o resultado foi como segue:
"De modo que cerca de 3.000 homens foram para lá, mas eles tiveram de fugir dos homens de Ai. Os homens de Ai mataram 36 homens; perseguiram os israelitas desde o lado de fora do portão até Sebarim, matando-os na descida. Por isso, o coração do povo derreteu e se tornou como água. [...] Israel pecou; eles violaram o pacto que lhes ordenei que guardassem. Pegaram algumas coisas do que havia sido condenado à destruição, furtando-as e colocando-as secretamente entre os seus próprios bens. Por isso, os israelitas não poderão se manter firmes contra os seus inimigos. Virarão as costas para fugir dos seus inimigos, visto que se tornaram algo condenado à destruição. Não estarei mais com vocês, a menos que eliminem do seu meio o que foi condenado à destruição". (Josué 7: 4,5,11,12)
As partes sublinhadas foram destacadas pelo ancião; ele salientou que o pecado de um só homem fez com que Deus considerasse todo o Israel uma nação pecadora, resultando na morte de trinta e seis homens. Quis então saber o que eu achava disso e respondi-lhe que até aquele momento não havia considerado as coisas desse ponto de vista. Mas então, já em 2011, essa questão voltou à minha mente e deixou-me em estado de atenção.
Eu podia recorrer da decisão de me excomungarem, mas estava em dúvida sobre se a decisão dos anciãos tinha ou não o aval de Deus.
Pressupondo que tinham, como ficariam as coisas se em novo julgamento eu fosse absolvido? Ficaria então na mesma situação de Acã, ocasionando dessa forma a que Deus retirasse toda a sua proteção dos meus irmãos e isso, para mim, era inadmissível. Eu não faria nada que viesse de alguma forma prejudicar a meus irmãos.
Pressupondo que não tinham, eu ainda estava sujeito a que uma comissão de apelação viesse a confirmar a decisão pela desassociação. Uma vez que me era impossível saber quanta influência Deus tinha em tudo isso, uma confirmação iria aumentar ainda mais a humilhação que já me era esmagadora.
Por outro lado, caso fosse absolvido, independente de culpa ou inocência, eu teria que conviver com os anciãos numa atmosfera de desprezo e condenação e isso me seria muito desagradável.
Tendo considerado todos esses fatores, decidi não recorrer. Se o julgamento fora compatível com a decisão de Deus, então cumprir a sentença e fazer as mudanças esperadas era o recomendável; por outro lado, se não era da vontade de Deus que eu fosse expulso de sua família, então os anciãos, como todo ser vivente, prestariam contas a Deus e este resolveria essa questão do modo como achasse apropriado. Tudo considerado, a decisão estava tomada.
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