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A questão do sangue


É conhecido de muitos que as Testemunhas de Jeová não aceitam passar por uma transfusão de sangue, mesmo que a consequência seja a morte. Essa proibição também é imposta a seus filhos menores, mesmo que tenha a morte por consequência. É lógico que se trata de mais uma interpretação do Corpo Governante que, nessa questão, muito se estriba em Atos 15: 28, 29. A respeito dessa questão, a literatura destinada à formação de novos membros trata do assunto com muitos detalhes. Mas novamente deixa de avisar sobre a consequência para aqueles que, numa emergência, deixam de seguir a orientação do Corpo. 

A consequência, notável por estar ausente nos livros preparados para o iniciante, consta de forma explícita numa publicação de 1993: 

"Coerente com esse entendimento da questão, a partir de 1961, quem quer que desconsiderasse esse requisito divino, aceitando transfusão de sangue, e manifestasse uma atitude impenitente seria desassociado da congregação das Testemunhas de Jeová (Proclamadores do Reino, página 183).


Bem mais antiga é uma publicação de 1983, que é também muito clara sobre o assunto:

"Lemos também que os cristãos devem ‘abster-se de coisas sacrificadas a ídolos, de sangue, de coisas estranguladas e de fornicação’ e que supostos irmãos que promovem ensinos falsos devem ser rejeitados. (Atos 15:28, 29; Tito 3:10; 2 João 9-11) Evidentemente, estão envolvidas leis aqui. Um praticante de tais pecados não pode tornar-se verdadeiro cristão. E, se um servo de Deus se empenha impenitentemente em tais pecados, ele deve ser desassociado (A Sentinela de 15 de janeiro de 1983, página 20).


Mas será que a autoridade religiosa tem posto em prática essa determinação? Até o momento, nenhum caso consta em sua literatura; há, no entanto, relatos de excomunhão por esse motivo. Um exemplo notável é o do norte-americano George West, de Maynard, Massachusetts. No leito hospitalar, e à hora da morte, ele foi informado de que seus filhos vinham visitá-lo. Ver os filhos era algo que ele muito queria, visto que já não os via desde a infância. Em razão disso, com o fim de ter mais um tempo para esperá-los, West aceitou uma transfusão de sangue. Isso acabou sendo de conhecimento dos anciãos e estes não tiveram nenhuma misericórdia com West (Em Busca da Liberdade Cristã, de Raymond Franz, páginas 421,422). 

Porém, em algum tempo posterior a 1993, o Corpo Governante reajustou a sua norma e a Testemunha que aceita transfusão de sangue não é mais expulsa (desassociação), mas diz-se que ela, em razão desse ato, abandonou voluntariamente a religião (dissociação). Pode-se ver isso em outro livro secreto intitulado Pastoreiem o Rebanho de Deus (veja imagens a seguir).



Pastoreiem o Rebanho de Deus, edição de Abril de 2020, páginas 110,111. 

Também nesse caso fica-se em dúvida sobre o porquê da mudança. Assim como participar da política é um direito assegurado pela Constituição brasileira, o direito à vida, pelo que é do meu conhecimento, também é algo assegurado por todas as nações dos tempos modernos. Dessa forma, fica-se a perguntar por que, com respeito a esses dois assuntos, a organização religiosa decidiu que a coisa mais apropriada é declarar que a Testemunha saiu voluntariamente da religião, quando o mais comum é a expulsão. Certamente há casos em que a Testemunha quer de fato sair da religião, mas nem sempre é o caso de quem aceita uma transfusão de sangue ou participa de atividade política. Então por que dizer que essa Testemunha saiu voluntariamente quando esse não foi o caso? Seria isso uma forma ardilosa de a organização religiosa procurar isentar-se de responsabilidade perante a opinião pública? 

Por fim, em conclusão deste assunto, resta o fato de que nada disso é dito nos livros destinados à preparação de novos membros. E com respeito à mudança de desassociação para dissociação, nem a Testemunha de Jeová comum está devidamente informada, visto que essa mudança, até essa data, consta apenas em um livro secreto, de leitura restrita aos pastores. Considerando isso, não se trata de fato de um claro exemplo de em que o iniciante é levado a tomar uma decisão com base apenas em informações rudimentares? Do contrário, que justificativa se apresenta para que seja assim?  


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