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De quem o Corpo Governante realmente copiou sua autoridade

Diante das evidências aqui apresentadas, tanto na parte em que analisamos se as Testemunhas de Jeová estavam em condições de ser aprovadas em um suposto teste em 1918/1919, bem como se realmente existe base bíblica para a existência de um corpo governante que governa sobre os cristãos, parece-me que podemos concluir que as Testemunhas de Jeová, pelo modo como são administradas, não seguem nenhum padrão que possamos chamar de cristão. Onde podemos encontrar então o modelo administrativo adotado pela religião?

Em seu segundo livro intitulado Em Busca da Liberdade Cristã, Raymond Franz faz uma extensa consideração sobre como era administrada a primitiva congregação cristã e como foram inseridas alterações à medida que as décadas se passavam. 

Como a Torre de Vigia muito costuma reprisar, Jesus Cristo, na parábola do joio e do trigo, alertou que, após a sua morte, haveria a infiltração de cristãos falsos dentro da congregação cristã (Mateus 13). Paulo também alertou contra isso (Atos 20). Após a morte dos apóstolos, isso logo começou a acontecer. Com o objetivo de combater esse começo de apostasia, os anciãos de cada congregação verificaram que era mais apropriado conceder maior poder de liderança a alguém que escolhiam para líder – o superintendente ou bispo. Posteriormente, com o fim de garantir união, os bispos passaram a se juntar em conferências regionais, e por fim, a nível nacional (Concílio de Nicéia, em 325 EC). Então, uns 300 anos após a morte de Cristo, o modelo administrativo vigente se encaminhava rapidamente para uma administração centralizada – que finalmente veio se concretizar na pessoa do papa, o líder máximo da Igreja Católica. 

Obviamente, o Corpo Governante não vê nenhuma semelhança entre ele próprio e o modelo papal. Como a Igreja também procura justificar seus concílios com base no episódio relatado no capítulo 15 de Atos, o Corpo Governante publicou, em 1986, um artigo com o seguinte tema: “São os concílios religiosos aprovados por Deus?” Em conclusão do artigo, é dito o seguinte: 

Inquestionavelmente, todos os concílios eclesiásticos da cristandade [Igreja Católica e as demais religiões consideradas cristãs] diferiram grandemente da reunião dos apóstolos e anciãos em Jerusalém, no primeiro século. Não havia ali presente nenhum clérigo ávido de poder, para impor pesados jugos aos pescoços de outros, ou para alimentar as chamas de estacas de execução. Antes, foram manifestos os frutos do espírito de Deus. As deliberações foram orientadas pelo espírito e em harmonia com a Palavra de Deus. E esse modo de resolver questões bíblicas é hoje seguido pelo Corpo Governante das Testemunhas de Jeová. 

A carta que os apóstolos e anciãos de Jerusalém enviaram aos concrentes dizia em parte: “Pareceu bem ao espírito santo e a nós mesmos não vos acrescentar nenhum fardo adicional, exceto as seguintes coisas necessárias: de persistirdes em abster-vos de coisas sacrificadas a ídolos, e de sangue, e de coisas estranguladas, e de fornicação.” (Atos 15:22-29) Essas não eram leis de simples origem humana, mas eram requisitos baseados em decretos anteriores do grande Legislador. — Gênesis 9:3, 4; Deuteronômio 5:8-10, 18; Isaías 33:22. 

Aquela reunião dos apóstolos e anciãos em Jerusalém no primeiro século teve a aprovação de Jeová Deus, pois suas decisões tiveram Sua bênção, e ela promoveu a obra de pregação do Reino que encaminhou muitos gentios para a congregação cristã. Todavia, os fatos da história provam claramente que os concílios eclesiásticos da cristandade nunca foram aprovados por Deus (A Sentinela de 15 de maio de 1986, páginas 24-26).
 
O Corpo Governante espera com isso fazer um contraste entre a atuação dele, como um concílio permanente, e os concílios da cristandade, em especial aos da Igreja Católica. Será que obteve êxito? 

No primeiro parágrafo, faz-se uma clara referência aos concílios da Igreja Católica, os quais seriam compostos por clérigos ávidos de poder, prontos a impor pesados jugos aos pescoços de outros e a alimentar as chamas de estacas da Inquisição. 

Mas um “pesado jugo” define também a situação dos milhares de jovens que passaram anos em prisões por todo o mundo – tudo em razão da proibição de se aceitar serviço civil alternativo. Fora isso, quem é Testemunha de Jeová sabe quantas regras estabelece o Corpo Governante, as quais visa controlar cada passo que se dá, sendo que deixá-las de seguir, mesmo que não resulte em excomunhão, acaba por tornar a Testemunha um imprestável no meio religioso. Sinceramente, isso em nada difere de um “pesado jugo”.

O Corpo Governante se sente à vontade para fazer críticas a clérigos ávidos de poder, mas isto se dá somente por que ele próprio, tendo na mão a caneta e o papel, decidiu manter oculto o modo como conseguiu impor-se como autoridade. Conforme conta Raymond Franz, a ascensão de um corpo governante entre as Testemunhas de Jeová só se deu a expensas de muita ira e discussão – muito diferente da tão proclamada harmonia que alega reinar entre eles. Pode ser que os membros do Corpo, em geral, não sejam ávidos de poder. No entanto, detendo um poder absoluto, eles estão prontos para reprimir toda e qualquer ação de qualquer Testemunha que, de alguma forma, queira subir alguns degraus, a caminho donde está o Corpo, sem que esteja seguindo rigorosamente os critérios de ascensão estabelecidos por ele; e ainda, no final das contas, o Corpo reservou para si a palavra final sobre a quem estenderá a mão. Com isso, há que se perguntar se o Corpo está em condições de apontar o dedo para ‘clérigos ávidos de poder’. 

É verdade que muitos foram lançados na fogueira da Inquisição. Essa foi a maneira que a Igreja achou para combater aquilo que ela considerava apostasia. Em contraste, o Corpo Governante não usa a fogueira como punição. No entanto, a sua política de excomunhão é implacável contra todo aquele que lhe resiste – e nisso, para o excomungado, a crueldade equipara-se à fogueira da Inquisição, uma vez que, pelas evidências, o Corpo Governante pode estar cometendo muitas injustiças. 

No segundo parágrafo, o Corpo questiona a legislação efetuada pelos concílios religiosos. Em se tratando da questão do sangue, até aquele ano – 1986 – o autor do artigo podia se sentir à vontade para assim se expressar. Depois do ano 2000, quando o Corpo fez ajustes na sua posição sobre o sangue, seria muito constrangedor tentar negar que, nessa questão, esteja algum raciocínio puramente humano, assim como nos diversos concílios que o Corpo tanto condena. 

O último parágrafo afirma corretamente que Jeová aprovou a decisão dos apóstolos na questão da circuncisão. Depois disso, busca apoio nos fatos históricos para afirmar que Deus nunca aprovou as decisões tomadas pelos diversos concílios religiosos. Em contraste, a autoridade religiosa deseja nos fazer crer Deus tem aprovado todas as decisões tomadas pelo Corpo Governante. Mas conforme já vimos até aqui, e conforme será mostrado nos capítulos seguintes, há muitos fatos que depõem contra essa ideia. De fato, muitos que investigaram o assunto, concluíram que “os fatos da história provam claramente que os concílios eclesiásticos da [liderança das Testemunhas de Jeová] nunca foram aprovados por Deus”. 

O Corpo Governante, na atualidade, considera que seu arranjo de manter anciãos nas congregações segue o modelo cristão, conforme descrito a seguir: 

Além disso, designaram anciãos para eles em cada congregação, fazendo orações e jejuando, e os entregaram aos cuidados de Jeová, em quem tinham passado a crer (Atos 14: 23; Tito 1:5).

Uma particularidade do texto acima é que os “anciãos” designados foram deixados “aos cuidados de Jeová”, o que significa que eles, no exercício de suas funções, podiam esperar ser orientados pelo espírito santo. Isso está de acordo com o que vimos até aqui, sobre se as congregações realmente estavam subordinadas aos apóstolos como um corpo governante. 

A realidade para as Testemunhas de Jeová, no entanto, é bem diferente disso. Elas têm os anciãos como seus pastores, mas estes, ainda que se deixem ser orientados por Deus, não podem fazer absolutamente nada que seja diferente do que é estabelecido pelo Corpo Governante. O resultado é que, por se deixarem guiar unicamente pelo Corpo, os anciãos poderão estar se opondo à orientação divina sempre que essa não esteja de acordo com a orientação do Corpo – e as evidências apresentadas até aqui não são favoráveis ao conceito de que o Corpo está sempre certo. 

Apesar disso, é essa realidade que o Corpo Governante usa nas suas constantes tentativas de mostrar que atende a exortação de Cristo de que, entre seus seguidores, não havia espaço para um líder, que todos eram irmãos enquanto que somente ele era seu líder (Mateus 23). É verdade que os anciãos nas congregações não se subordinam a uma autoridade papal; no entanto, nem os padres católicos espalhados pelo mundo se subordinam tanto a uma autoridade espiritual quanto o fazem os anciãos nas congregações. Os bispos católicos eventualmente são convocados pelo Papa a discutir assuntos de interesse geral da Igreja, inclusive a formação ou ajustes de doutrinas. O Corpo Governante, ao contrário, em se tratando de questão espiritual, não pede nenhuma sugestão a qualquer de seus subordinados, e até determinou que a reposta a qualquer questionamento, se já não for encontrada na literatura, deve ser aguardada em silêncio, até que ela venha por meio do Corpo, sabe-se lá quando. 

Visto que essa é a realidade de fato, que garantias há de que essa autoridade religiosa está sendo orientada por Deus? Visto que Cristo falou claramente sobre cegos guiar cegos e sobre as consequências disso, é imperativo que saibamos se o Corpo tem guiado seus seguidores por caminhos seguros. Com o objetivo de investigar isso, o capítulo seguinte analisa uma questão sensível da história cristã: a volta de Cristo. O assunto, lamentavelmente, revelou ser um doloroso teste para a autoridade espiritual das Testemunhas de Jeová. 


Comentários

  1. De certeza. O corpo governante se esforca em se diferenciar da Igreja Catolica, mas não se dista dela aquando dos pesados jugos e o poder eclesiástico.

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