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O eclipse citado pela VAT 4956

A tabuinha menciona um eclipse lunar que, segundo os cálculos, ocorreu no 15.° dia do terceiro mês babilônico, simanu. Realmente ocorreu um eclipse lunar nesse mês em 568 AEC — 4 de julho no calendário juliano. No entanto, também houve um eclipse 20 anos antes, em 15 de julho de 588 AEC. Se 588 AEC marcou o 37.° ano de Nabucodonosor II, então seu 18.° ano cairia em 607 AEC – exatamente o ano que a cronologia bíblica indica para a destruição de Jerusalém. (Veja a linha do tempo abaixo.) Mas será que a VAT 4956 fornece mais evidencias para o ano 607 AEC? (Revista de Novembro, página 25).


De forma resumida, o primeiro parágrafo nos trás a atenção dois eclipses: um ocorrido em 568 AEC, e outro, em 588 AEC. Os dois ocorreram de fato. A qual deles faz referência a VAT 4956? O segundo parágrafo nos diz onde a Torre de Vigia quer chegar. No entanto, por desconhecimento ou por malícia, os autores deixam de fazer referência à BM 38462. Trata-se de uma tabuinha que registra um eclipse datado do 4º mês do 17º ano de Nabucodonosor. Pressupondo que os historiadores estejam certos em datar o primeiro ano de Nabucodonosor em 604/3 AEC, então seu 17º ano será em 588/7 AEC. Por outro lado, caso a Torre de Vigia esteja certa em datar o primeiro ano de Nabucodonosor em 624/3 AEC, o 17º ano de Nabucodonosor passa a ser 608/7 AEC. Com essas duas opções à mão – 588 AEC e 608 AEC –, pode-se recorrer a programas de computador e verificar em qual desses anos ocorreu um eclipse no quarto mês. Para o ano de 588 AEC, Carl Olof Jonsson, usando o programa SkyMap Pro 11, localizou a ocorrência de um eclipse no amanhecer do dia 15 de julho. Isso é significativo porque essa data do calendário juliano corresponde de fato ao 4º mês do calendário babilônico. Como a tabuinha é datada do 17º ano de Nabucodonosor, esse eclipse de 588 AEC põe o 18º ano desse rei em 587/6 AEC. Mas consideremos que o 17º ano de Nabucodonosor seja 20 anos antes, em 608/7 AEC. Houve um eclipse no quarto mês desse ano? Jonsson localizou dois eclipses nesse ano, mas não no quarto mês. O primeiro ocorreu em 24 de agosto (sexto mês), e o segundo, em 19 de janeiro (décimo primeiro mês?).

Diante dessas evidências, fica claro que a Torre de Vigia, ao sugerir que o eclipse citado pela VAT 4956 ocorreu no dia 15 de julho de 588 AEC, ela está se referindo ao mesmo eclipse citado pela BM 38462. Porém, para transpor o eclipse da VAT 4956 de 568 AEC para 588 AEC, ela teria também que explicar como transpor de 588 AEC para 608 AEC o eclipse citado pela BM 38462. Ao que me parece, a estratégia usada para poupar-se a essa explicação foi fazer-se de ignorante a respeito da existência desta última tabuinha.

Conforme a Torre de Vigia reconhece, o eclipse de 568 AEC ocorreu em “4 de julho do calendário juliano”. Segundo Jonsson, esse “4 de julho” está dentro do 3º mês do calendário lunar babilônico. A Torre de Vigia, ao transpor de 568 AEC para 588 AEC o eclipse citado pela VAT 4956, precisa fazer uso de um eclipse que ocorreu no dia 15 de julho, e ainda assim fazer que esse dia seja alcançado pelo 3º mês do calendário lunar. Será que isso é possível?

Conforme foi abordado na consideração preliminar, tanto em Israel como em Babilônia o ano começava com a primavera. Em resultado de usarem o calendário lunar, a cada dois ou três anos essas duas nações adiantavam o ano em um mês, cujo objetivo era acertar o calendário lunar com as estações do ano. É esse 13º mês que, atualmente, quando acrescentado, acaba movendo a páscoa de meados de março para meados de abril. Depois disso, a cada ano a páscoa ocorre cerca de 10 dias mais cedo, por dois ou três anos seguidos, quando novamente se faz necessário acrescentar um 13º mês. As Testemunhas de Jeová estão familiarizadas com isso porque a cada ano comemoram a páscoa no dia 14 de nisã, o primeiro mês do calendário lunar usado pelos israelitas. A tabela abaixo mostra a data da páscoa por um período de 38 anos (é preciso lembrar que a inserção do 13º, para o cálculo da data da páscoa convencional, está fora de sincronia com a inserção do 13º mês pelo calendário judaico). Como pode ser visto na tabela, o dia 14 de nisã de todo ano cujo anterior foi acrescido de um 13º mês sempre ocorre no mês de abril (tarja amarela no ciclo de 19 anos: 3º, 6º, 8º, 11º, 14º, 17º e 19º). É lógico que, em razão desse acréscimo de um mês ao ano anterior, todos os meses do ano são adiantados em cerca de um mês lunar.

Como o calendário de Babilônia também começava com a primavera, essa explicação prévia deve nos ajudar a checar se o terceiro mês do calendário de Babilônia alcança o dia 15 de julho de 588 AEC, como requer a explicação da Torre de Vigia.




Na sua resposta ao segundo artigo da revista A Sentinela, Doug Mason disponibilizou a tabela abaixo (em inglês, sem edição). Ela mostra o calendário lunar babilônico para os anos de 568/7 AEC, 588/7 AEC e também para os anos que contextualizam essas datas.




Veja a tabela com edição abaixo. Note que o nisanu de 588/7 AEC começou em 4 de abril (calendário juliano); o 3º mês desse ano começou em 2 de junho. Assim, seria necessário um simanu de 43 dias para que esse 3º mês alcançasse o dia 15 de julho, como requer a explicação da Torre de Vigia.



Evidentemente, os autores do artigo estão conscientes desse problema, pois, relacionado a isso, escreveram a seguinte nota (os colchetes são da Torre de Vigia):

Babylonian Eclipse Observations From 750 BC to 1 BC, de Peter J. Huber e Salvo De Meis, publicado em 2004, página 186. Segundo a VAT 4956, esse eclipse ocorreu no 15.° dia do terceiro mês babilônico, o que indica que o mês de simanu começou 15 dias antes. Se o eclipse aconteceu em 15 de julho de 588 AEC, de acordo com o calendário juliano, então o primeiro dia de simanu seria 30 de junho/1.° de julho de 588 AEC. Portanto, o primeiro mês babilônico (nisanu) teria dado inıcio ao novo ano dois meses antes, em 2/3 de maio. Ao passo que normalmente o ano desse eclipse teria começado em 3/4 de abril, a VAT 4956 menciona na linha 6 que um mês extra (intercalar) foi acrescentado depois do décimo segundo (último) mês (adaru) do ano anterior. (A tabuinha diz: “8.° dia do mês XII2 [13.° mês].”). Portanto, isso significa que o novo ano realmente não começou antes de 2/3 de maio. Assim, a data desse eclipse em 588 AEC se encaixa bem na data mencionada na tabuinha (Revista de Novembro, página 28).


Quando a revista A Sentinela diz que “normalmente o ano desse eclipse teria começado em 3/4 de abril”, ela se refere a 588/7 AEC. E por que ela diz isso? É evidente que os autores têm em mãos a mesma tabela que Doug Mason disponibilizou, pois, como visto anteriormente, o ano de 588/7 AEC começa em 4 de abril. E qual a solução que os autores apresentam para fazer que o 3º mês alcance o dia 15 de julho? Eles leram na VAT 4956 que um 13º mês foi acrescentado ao ano anterior. Presumindo que essa tabuinha de fato se refira ao eclipse de 588 AEC, os autores, ao considerar a adição de um 13º mês ao ano anterior, 589/8 AEC, movem o início do ano de princípios de abril para princípios de maio. Com isso, o 2º mês é movido para o princípio de junho, e o 3º, para o fim desse mês. O resultado é que eles conseguiram fazer que o 3º mês alcançasse o dia 15 de julho. Infelizmente, para os autores, essa mesma argumentação pode ser aplicada – e com muito mais propriedade – para justificar o eclipse de 568 AEC. É claro que, apesar de terem guardado silêncio a respeito disso, os autores não desconhecem o fato de que o 13º mês só é acrescentado quando o ano termina muito cedo em relação à estação do ano, e, visto que o ano de 569/8 AEC terminou em 3 de abril, ao passo que o ano de 589/8 AEC terminou em 13 de abril, o acréscimo do 13º mês faz-se mais necessário no primeiro caso. Como a Torre de Vigia deixou de justificar como a BM 38462 se ajusta à VAT 4956, o bom senso diz que a coisa certa a fazer é aceitar exatamente o que essas tabuinhas dizem, isto é, que o 17º ano de Nabucodonosor corresponde a 588/7 AEC e que o seu 37º ano corresponde a 568/7 AEC. Dessa forma, fica estabelecido duplamente que o 1º ano de Nabucodonosor corresponde a 604/3 AEC e, por conseguinte, o seu 18º ano passa a ser 587/6 AEC – exatamente como dizem as listas de reis e as tabuinhas econômicas.



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