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Joseph F. Rutherford

O fim esperado não veio em 1914, o que decepcionou a muitos, e em 1916 Russell veio a falecer. Com a morte do líder, os associados votantes da Sociedade Torre de Vigia elegeram Joseph F. Rutherford (foto à esquerda) como substituto. As decepções com relação a 1914 criou uma onda de insatisfação, que veio a aumentar com o estilo arrojado de Rutherford, que tomava decisões sem a ninguém consultar, criando um estilo ditatorial de governar. Fazendo uso dos poderes que o cargo lhe concedia, Rutherford condicionou as coisas a tal ponto que todos os insatisfeitos acabaram por se afastar. Em vista disso, ele é apresentado na literatura da Torre de Vigia como o homem certo no lugar certo e na época certa. 

A obra de pregação do reino iniciada por Russell logo foi adotada por Rutherford e este iria, em breve, imprimir a sua marca. Mas pregar que reino? Cristo não assumiu o Reino em 1914, como todos esperavam. A estes, Rutherford precisava dar uma explicação. E ela veio em forma de nova data: 1925 – a verdadeira data para a volta de Cristo. Mas tal qual a anterior, a nova data também fracassou. Como as Testemunhas de hoje explicam tudo isso? Bem, 1925 foi para a lata de lixo do tempo. Sobre 1914, optou-se por dizer que, como Russell havia previsto, Cristo de fato voltou, mas desde então governa de modo invisível e assim permanecerá até o Armagedom. 

O fracasso de qualquer declaração profética condenaria à morte por apedrejamento qualquer profeta do Antigo Testamento (Deuteronômio 18: 20-22).  Mas os tempos são outros e Rutherford, inabalável, uma vez que fora escolhido para líder, passou a agir como tal – para os amigos e inimigos. 

Passado os incômodos resultantes do fracasso que fora 1925, Rutherford aproveitou a década de trinta para implantar uma série de medidas que viria a dar uma identidade ao grupo. 

A primeira medida foi anunciada em 1931. Até aquele ano, o grupo religioso era mais conhecido pelo nome genérico de Estudantes da Bíblia, embora muitos também os chamassem de “russelitas” e “rutherfordistas”; também, entre eles próprios, o nome “cristão” era mais que apropriado. Mas então, segundo argumentos de que não eram seguidores de homens e que, como eles, muitos se declaravam cristãos, mas sem, contudo, viver à altura desse nome, Rutherford anunciou a uma multidão reunida um novo nome: Testemunhas de Jeová. A novidade foi recebida com aplausos e deu a muitos um incentivo para maior empenho no serviço de evangelização. 

Uma segunda medida veio em 1935. Até aquele ano não se declarava que apenas 144 mil pessoas seriam escolhidas para viver no céu. Embora se afirmasse que apenas 144 mil seriam reis, o capítulo 7 de Apocalipse, que contrasta 144 mil contados com uma grande multidão incontável, dava-lhes a ideia de que também essa grande multidão iria para o céu, embora lhe fosse oferecida uma condição rebaixada – talvez porque, enquanto na terra, não fora tão fiel quanto os demais, que compunham os 144 mil (Esse assunto é discutido com mais detalhes no capítulo 7). Então, em 1935, enquanto falava a uma assistência de milhares de pessoas, Rutherford fez referência a uma terra restaurada, um ambiente paradisíaco tal qual vivia Adão e Eva. Depois disso, dirigindo-se à assistência, pede que se ponha de pé todo aquele que tem esperança de viver para sempre na Terra. À metade da assistência que se põe de pé, Rutherford afirma: 

“Eis a grande multidão!”

Desde então, as Testemunhas de Jeová dividem-se em dois grupos: os que fazem parte dos 144 mil que vão viver no céu e a “grande multidão” que viverá na Terra. Essa é uma característica básica da religião. A explicação diz que, como os 144 mil se compõem de todos os cristãos que viveram durante os últimos dois mil anos, as Testemunhas de Jeová que expressam esperança celestial são apenas o complemento desse número. Durante quase todo o resto do século XX, a liderança explicava que Deus só escolhia um novo integrante para o grupo em substituição de alguém que morreu infiel. Até o início deste século, os números pareciam corresponder aos fatos, pois os ungidos, como são chamados, diminuíram de cerca de quarenta mil para cerca de oito mil. Mas desde então tem aumentado e já chega a quatorze mil atualmente. Em razão desse aumento, a liderança já não mais afirma que os novos ungidos são substitutos de ungidos que morreram infiéis, o que, naturalmente, os impedem de dizer que os 144 mil estão completos. Tudo isso torna cada vez mais difícil defender a ideia de que esses 144 mil de Apocalipse são de fato o número exato de pessoas que vão viver no céu, mas, por enquanto, a liderança não dá sinais de que pretende abandonar a doutrina.

Como terceira medida, Rutherford concluiu, em 1938, um processo administrativo que consistia na centralização do poder. Até 1932, as congregações elegiam dentre seus componentes os dirigentes dela, e esses eleitos eram o alvo de Rutherford. Como muitos desses eleitos não se sujeitavam voluntariamente à autoridade de Rutherford, pregando de casa em casa assim como ele queria, estava decidido que a partir de 1932 deixava de existir a eleição de dirigentes, sendo que cada congregação escolheria um diretor de serviço a ser aprovado pela sede em Brooklyn. Brooklyn naturalmente só aprovaria o diretor se este fosse firme em sua sujeição aos ditames de Rutherford. Dessa forma, Rutherford pôde condicionar as coisas de modo a subordinar cada congregação ao poder dele, podendo então efetuar de modo mais eficaz o serviço de pregação de casa em casa, que, naquela época, consistia basicamente na comercialização dos livros dele. Mas ainda não era satisfatório para Rutherford. As congregações ainda podiam nomear pessoas para outros cargos locais, um resquício de independência; pois isso também lhes foi tirado em 1938, com Brooklyn passando a nomear os ocupantes de todos os cargos nas congregações. 

A nova religião ganhava gradualmente a cara de Rutherford. Como conclusão de sua marca, o termo “organização” foi usado para caracterizar o grupo religioso e sua estrutura administrativa. Assim, começando pela década de trinta, a obsessão por “organização” tornou-se uma marca registrada da religião, com os escritos veiculados fazendo fortes exortações de que não há vida em nenhum outro lugar, senão na organização de Jeová – termo que se tornou quase sinônimo do nome adotado em 1931. Assim, com a nova religião, com direito a nome e estrutura de religião, criou-se duas classes de pessoas: as Testemunhas de Jeová e as outras religiões, as primeiras destinadas à salvação e as outras destinadas à condenação. Que esse conceito prevalece ainda hoje, toda Testemunha de Jeová sabe. Apesar disso, pode-se ler a seguinte informação numa publicação do Corpo Governante: 

As Testemunhas de Jeová acreditam que só elas serão salvas?

As Testemunhas de Jeová acreditam que encontraram a religião verdadeira. Se não acreditassem, elas mudariam de religião. Assim como os membros de muitas religiões, as Testemunhas de Jeová esperam ser salvas. No entanto, também acreditam que não cabe a elas julgar quem será salvo. No fim das contas, Deus é o Juiz. É ele quem decide. — Isaías 33:22. (A Sentinela de 1º de novembro de 2008, página 28)

É claro que se trata apenas de uma politica da boa vizinhança. Pois, conforme cada Testemunha de Jeová pode confirmar para si mesma, a verdade de fato é a seguinte: 

Apenas as Testemunhas de Jeová, os do restante ungido e os da “grande multidão”, qual organização unida sob a proteção do Organizador Supremo, têm esperança bíblica de sobreviver ao iminente fim deste sistema condenado, dominado por Satanás, o Diabo. (Revelação 7:9-17; 2 Coríntios 4:4) (A Sentinela de 1º de setembro de 1989, página 19).

Essas foram grandes contribuições de Rutherford para a religião das Testemunhas de Jeová. Mas, assim como Russell, Rutherford teve que deixar o cenário. 


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